Olhar Crítico - Comunica Digital

Um olhar sobre economia, educação, filosofia e política.

ISSN 1808-785X

Beco sem saída ou ela é por outro lado?

Helder Gomes

Helder Gomes, doutor em Política Social e mestre em Economia (UFES).

As contas externas do Brasil apontam o grau de nossa subalternidade em relação às grandes potências imperialistas em plena depressão econômica mundial. As oscilações nos saldos da Balança Comercial apontam dificuldades cada vez mais impactantes, ao não compensar o elevado déficit na Balança de Serviços (viagens internacionais, transportes, aluguel de equipamentos, informações, royalties etc.) e na Balança de Rendas (lucros e dividendos, juros etc.), como pode ser observado no gráfico abaixo.

É possível observar que os saldos positivos na Balança Comercial, nos últimos anos, estiveram acima daqueles apresentados no auge da euforia com as exportações para a China, no início do século. Entretanto, incapazes de compensar os insistentes déficits nas Balanças de Serviços e de Rendas.

Abrindo essas contas, é possível observar, por exemplo, que a pauta de exportações foi totalmente invertida desde o início do século XXI. Os produtos básicos, que inicialmente representavam algo em torno 23% do total das vendas de mercadorias ao exterior, passaram a ter um peso elevadíssimo em 2019, alcançando o patamar de 52,8% do total exportado naquele ano. Sugiro a leitura de um artigo de José Eustáquio Alves sobre a especialização regressiva da pauta de exportações do Brasil no período.

Outra informação importante pode ser vista na abertura da conta de Serviços. Ela mostra alguma das consequências do grau da (re)especialização da economia brasileira neste início de século, pois, após a venda de patrimônio para empresas estrangeiras, o Brasil passou a alugar equipamentos, como tem sido o caso da venda e aluguel de plataformas de petróleo, por exemplo. Assim, garantir o tradicional esforço exportador brasileiro, ante a especialização do parque produtivo nacional, tem resultado num aumento vertiginoso nos pagamentos por aluguel de equipamentos e por serviços que envolvem computação e informação, ao mesmo tempo em que mantém gastos elevados com viagens ao exterior, entre outros serviços.

O gráfico abaixo procura mostrar a trajetória de déficits estruturais na Balança de Serviços. O comportamento aparentemente suavizado, a partir de 2015, resulta muito mais do aprofundamento da estagnação econômica do que por uma nova abordagem política dos governos recentes.

Da mesma forma, a trajetória da conta de Rendas também reflete o processo de desnacionalização do parque produtivo brasileiro. Após as privatizações de grandes empresas estatais e do fomento às fusões e aquisições de empresas privadas adquiridas por capitais estrangeiros, elevaram-se as remessas de lucros e dividendos remetidos anualmente ao exterior.

Além da desnacionalização do patrimônio esse movimento significou a transferência dos centros de decisão das empresas para o exterior. Isso significa uma redução ainda mais drástica na soberania sobre a determinação dos investimentos, degradando a capacidade nacional de planejamento sobre o futuro do parque produtivo brasileiro.

Como dissemos no artigo anterior, a deterioração nas contas externas do país impõe graus elevadíssimos de fragilidade e de vulnerabilidade da economia brasileira frente à crise econômica mundial. Ao mesmo tempo em que se elevaram as remessas de dólares ao exterior, cresceu associada a necessidade de atração de uma quantidade ainda maior de dólares via novos empréstimos. Assim, a economia brasileira se enredou profundamente na armadilha da dívida externa que, a despeito das mentiras que circulam sobre sua gestão, ela saltou de aproximadamente US$ 228 bilhões, em 2001, para algo em torno de US$ 620 bilhões, em meados 2020.

Portanto é uma falácia a cantilena de colocar a culpa de todos males na pandemia. Mas, também é falacioso acreditar na possiblidade de um redirecionamento radical nessa deterioração estrutural da soberania brasileira, a partir de um novo arranjo político que poderia surgir com as eleições de 2022. Propostas de ajustes, como controle dos fluxos de capital e taxação de grandes fortunas, parecem muito mais sonhos infantis, no atual ambiente de crises sistêmicas, do que um plano efetivo e viável.

Mais recentemente, quando me questionam sobre a viabilidade de taxar grandes fortunas no Brasil, tenho respondido com outra pergunta: onde estão as grandes fortunas das elites brasileiras, elas estariam passíveis de serem alcançadas pelo fisco? Na sequência, indico, para dar uma pequena mostra do sentido da minha indagação, a leitura de uma matéria da Revista Piauí, de fevereiro/21, com o sugestivo título “Os 300 de Luxemburgo”, na qual é apresentada uma investigação jornalística sobre um dos destinos das maiores fortunas das elites brasileiras. Leiam e depois me respondam!

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