Olhar Crítico - Comunica Digital

Um olhar sobre economia, educação, filosofia e política.

ISSN 1808-785X

Crítica e autocrítica na suprassunção permanente

Helder Gomes

Helder Gomes, doutor em Política Social e mestre em Economia (UFES).

“[…] o nosso interesse e a nossa tarefa são tornar permanente a revolução até que todas as classes mais ou menos possidentes estejam afastadas da dominação, até que o poder de Estado tenha sido conquistado pelo proletariado, que a associação dos proletários, não só num país, mas em todos os países dominantes do mundo inteiro, tenha avançado a tal ponto que tenha cessado a concorrência dos proletários nesses países e que, pelo menos, estejam concentradas nas mãos dos proletários as forças produtivas decisivas. Para nós não pode tratar-se da transformação da propriedade privada, mas apenas do seu aniquilamento, não pode tratar-se de encobrir oposições de classes mas de suprimir as classes, nem de aperfeiçoar a sociedade existente, mas de fundar uma nova.”

K. Marx e F. Engels, 1850.

Nos últimos meses, tivemos a oportunidade de contar com vários e intensos momentos para a nossa formação militante. Minicursos, palestras, lançamentos de livros e a história viva que pudemos coletar dos noticiários e das análises difundidas nas mídias sobre a conjuntura internacional e acerca da atual situação do Brasil, em particular. O aprofundamento das crises no capitalismo parece colocar novamente grandes desafios para a (re)interpretação sobre a realidade e, também, acerca dos limites e potenciais para uma ruptura mais radical da ordem mundial.

Tenho repetido que a chamada Guerra Fria, entre outras consequências, forjou o acirramento do dogmatismo entre boa parte da intelectualidade, das lideranças partidárias e da militância social. Com isso, a prática política, adequada ao que passou a ser pragmaticamente conhecida como a “Realpolitike”, acabou afastando o pensamento crítico, ou melhor, resultou na rejeição à possibilidade de crítica, em busca da difusão de determinados consensos. Óbvio, essa adesão acrítica deve ser contextualizada às circunstâncias e aos interesses em jogo.

Recuperando os ensinamentos de Marx e Engels, o professor argentino Miguel Veda nos chama à atenção não somente sobre a necessidade da análise crítica, enfatizando a autocrítica como fundamento no processo de suprassunção permanente. Não custa lembrar que a negação dialética é sempre um encadeamento, que envolve questionar o que está posto, aproveitar criticamente aqueles elementos considerados fundamentais e elevá-los a outro patamar, num contínuo procedimento de transformação.

Aproveitando desses ensinamentos, podemos observar, por exemplo, como tem sido rígida, no Brasil, a contestação aos processos em curso na China, ou na Venezuela, ao mesmo tempo em que tem sido quase proibitiva qualquer alusão crítica às decisões dos governos progressistas experimentados por aqui recentemente.

Assim, criticar tem se convertido em “levar água para o moinho adversário”. Fogueiras inquisitórias são imediatamente acesas, sempre que a crítica surge como consequência objetiva de sair do automático, das rotinas políticas da conveniência, fundadas em dogmas e apelos pragmáticos. Estes parecem elementos a ser considerados na busca de respostas sobre porque continuamos rodando o toco, reproduzindo continuamente caminhadas em círculo, repetindo os mesmos erros, prescindindo de uma estratégia efetiva.

Escapar dessas armadilhas requer, antes de tudo, resistir ao canto de sereia e retomar a produção do pensamento dialético, mantendo-o em permanente superação. Como ilustrado na epígrafe, nossos interesses e nossas ações cotidianas devem se voltar para a construção de uma nova forma de sociabilidade e, isso, exige uma permanente sintonia da crítica e da autocrítica, sem vacilações.

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